domingo, 16 de outubro de 2011

As luzes da cidade acesa


Quando eu era criança, em Bom Jesus do Itabapoana, era comum faltar energia à noite. Era um tempo em que morávamos num apartamento muito fofo, mas, por pura chantagem, minha irmã Laura dizia aos nossos pais que "vivia presa feito um passarinho". O fato é que tenho uma lembrança muito curiosa dessa fase e o nome dela é "Desculpe, mas eu vou chorar", do Leandro & Leonardo.

Nas noites em que não havia luz, ligávamos as velas. E muito longe desse hoje onde celulares, tablets e ipads conseguem segurar o tédio por um tempo, a saída era contar/ ouvir histórias ou cantar alguma coisa. Eu era uma garotinha muito da popular. Curtia sertanejo, romântico, brega. E algo sobre aquelas velas iluminando a sala e a cidade completamente escura faziam com que minha irmã e eu passássemos o tempo cantando o trecho "as luzes da cidade acesa, clareando a foto sobre a mesa". Pura ironia. Coisa de criança. A gente ria muito dessa breguice toda.

Uns bons anos depois, fico feliz em ter energia elétrica estável e um melhor gosto musical. Mas enquanto o domingo passa trazendo a chegada do horário de verão e eu preparo o jantar exibindo para mim mesma e para meu carinha as taças novas de vinho que comprei, é reconfortante pensar: "nossa, estamos todos bem".

Deu certo. Deu tudo certo. Algumas viagens planejadas já foram, porém as mais incríveis ainda estão por vir; o emprego dos sonhos, até que enfim admiti, pode ficar nesse plano por muito tempo, independente da minha vontade ou empenho; casamento é mais formalidade e menos romance; não preciso demonstrar que estou bem o tempo todo, porque, acreditemos, ninguém nunca está, mesmo que o digam quando nos encontram na rua... A verdade pacifica. O pensamento positivo, então... poderia ficar aqui listando todos os seus benefícios para sempre.

E o cinismo, que ele venha em nossa defesa sempre que for necessário. Porque se tem uma coisa que se aprende vivendo entre uma cidade pequena e outra grande é que tamanho não é nada para quem vive em busca de coisas iluminadas, e cada um sabe das suas. De repente aquela velha pergunta "Peixe pequeno numa lagoa grande ou peixe grande numa lagoa pequena?" não faz o menor sentido.  O negócio é ser peixe e nadar por aí.